Preciosidades

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Gothic Sex. Suelen Buschtabieren (1998)



Eine gotische sex.

H

á quatro noites seguidas venho tendo sonhos estranhos e perturbadores. Não são sonhos iguais, como tendentes a premonitórios, porém muito semelhantes, que me vem causando perplexidade. Nesse meu mundo onírico, vejo animais fantásticos, mitológicos, ninfas gregas nuas e imagens realísticas de cunho sexual. Hoje, antes de me deitar, senti um forte cheiro de almíscar, que me impregnou as narinas, deixando-me com um pouco de náusea. Não sabia de onde vinha e o porquê de tamanha intensidade. Jamais gostei do perfume, talvez porque me transporte a antigas festas noturnas, as quais não me trazem boas lembranças. Infância pobre e relacionamentos frustrados. A noite esfriara de repente e não me lembrava do que os meteorologistas haviam previsto na TV no dia anterior. Também isso pouco importava. Enquanto me remexia nos cobertores, tentando encontrar a melhor posição para dormir, ouvi, muito baixinho, longínquo, quase imperceptível, um som de harmônica. Era a melodia de greensleeves, lenta e suave. Não me importei, pois sempre adorei esta música, que sempre me lembrou algo medieval, antigo e romântico. Castelos, espadas, reis, rainhas, súditos. Adormeci como sempre, sem que me desse conta. Quando dei por mim, lá estava eu em uma sala enorme, onde se ouviam murmúrios, gemidos abafados e pingos de água intermitentes. Ou a luz era muito branca e forte ou minha pupila estava muito dilatada, pois eu não conseguia manter meus olhos abertos. Involuntariamente se fechavam, como que querendo proteção. Foram necessários alguns minutos para que me acostumasse com a aquela intensa claridade. Pude então ver que eu não estava só naquela estranha sala. Comigo estavam várias mulheres nuas ao meu lado, paradas, encostadas nas paredes úmidas. Circundávamos toda a sala. O chão metálico, molhado e frio, com pequenas saliências anti-derrapantes, semelhantes àquelas de ônibus. Ouvir o som dos pingos batendo no metal frio era incômodo e me dava dores de cabeça. Pareciam vir de inúmeras goteiras do teto, o qual eu não conseguia distinguir, não sabia se era inexistente ou muito alto. Uma névoa me impedia a visão. A nudez, a água, o frio, tudo deixava nossos corpos arrepiados. Minha pele assemelhava-se a de um sapo, meus pelinhos eriçados, meus seios e meus mamilos, de tão contraídos, começavam a doer. Vi, ao centro, uma maca parecida com aquelas de centro cirúrgico de hospital. Sem entender nada, percebi que eu e outras mulheres que estavam na sala não podíamos nos mover. Estávamos paralisadas, numa espécie de transe hipnótico. Contudo eu conseguia ver, ouvir e sentir tudo ao meu  redor. Surgiram de repente, saltitando, quatro pequeninas mulheres trazendo uma outra pelas mãos. Essas quatro pequeninas não pareciam mulheres como nós. Não eram meninas nem crianças. Eram como mulheres em miniatura. Lembraram-me Pamela Anderson. Loirinhas, quase oxigenadas, seios redondos e com mamilos apontando para o horizonte, rijos. Não tinham mais do que um metro de altura, mas não eram anãs. Seus púbis triangulares, desenhados para usar tanguinhas de praia, destacavam-se em meio à uma tez que quase me cegava. Corpos muito alvos e não menos arrepiados que os nossos. Colocaram cuidadosamente a mulher deitada  de costas na maca ao centro. Parecia uma gigante no meio de quatro anãs. Duas daquelas pamelazinhas nuas saíram em disparada. Retornaram, segundos depois, trazendo uma bandeja cheia de frutas. Enquanto uma segurava a bandeja, as outras três pequeninas apanhavam as frutas com suas minúsculas mãozinhas e começavam a introduzir na vagina da mulher da maca. Ela gemia, embora estivesse paralisada como nós, parecendo sentir um enorme prazer com aquilo. Morangos, framboesas, amoras e uvas. Uma a uma. Todas eram inseridas cuidadosamente pelas mãozinhas delicadas das pequeninas, enchendo a vagina. A cena me excitada tanto que esquecia, por momentos, o frio e o medo. Via, admirando a cena, que, para as pequeninas, era um orifício fácil de transpor, pois quase metade de seus braçinhos sumia ao colocar bem fundo no canal vaginal. Quando algumas uvas teimaram em não permanecer no interior daquela pequena caverna mágica, pararam. Entreolharam-se as quatro, como que combinando algo telepaticamente, e saíram em correria, exclamando uma faceirice quase infantil. Demoraram alguns minutos e retornaram. Agora vinham puxando, com grande esforço, um ser fantástico. Semelhante a um centauro. Só que não se parecia em nada com aqueles centauros vigorosos que conhecemos nas aulas de história, com corpo de cavalo árabe e torso de um homem forte e musculoso, empunhando arco e flecha. Não, este não! Este parecia um animal moribundo, velho, tomado por necrose e manco de uma pata. Fedia. Levavam-no sob o som de pequenos beijinhos, implorando que fosse adiante. Mal as pequeninas aproximaram o  horrendo animal da maca e se fez brotar toda a sua derradeira virilidade. O animal ancião pareceu recobrar suas forças do fundo de sua alma, se acaso tivesse uma, deliciando-se da beleza da mulher que estava prestes a cobrir. Colocou suas patas dianteiras sobre a maca, num ímpeto de garanhão, emitindo um grito quase que ensurdecedor. Ficou ressoando pela sala, fazendo todas as mulheres manifestarem-se, mais por medo que por excitação. As quatro pequeninas, então, foram duas de cada lado do animal e seguraram o membro enorme que surgia da velha genitália flácida e enrugada daquele ser. O animal avançou e, bem próximo da vagina cheia de frutas da mulher, começou a movimentar cadenciadamente os quartos. Não demorou muito e o sêmen branco em grande quantidade misturou-se ao vermelho das frutas esmagadas dentro daquela vagina. O canal vaginal, agora, parecia mais um túnel violentado que uma caixa de segredos mágicos. Segundos depois o animal caía morto, inerte, um amontoado no chão metálico, sem expelir sequer um suspiro. Com sua missão cumprida, pôde descansar na certeza de preservar algum espécime, que jamais viria a saber qual. Rapidamente, as pequeninas mulheres se livraram do que sobrara do animal. Um monte de pele e ossos. Após o coito, a mulher sobre a maca começou a sofrer algumas crises convulsivas. Logo, em meio aos seus gritos e gemidos, vi seu ventre inchar rapidamente e se contrair, numa metamorfose, como se uma gestação se passassem em minutos. As pequeninas criaturinhas ajudavam no que podiam e, sem demora, a mulher pariu algo horrendo e nojento. Como uma larva de inseto gigante. Branca em movimentos frenéticos e involuntários. Enorme como uma cobra prenhe. Logo depois de parir, era a vez da mulher cair igualmente morta sobre a maca. Fiquei imaginando que talvez todas nós tivéssemos que passar por aquela provação. Minhas pernas pareciam faltar, mas esqueci de mim, ao ver que a larva parida aumentava de volume rapidamente. Fiquei petrificada olhando o que estaria por surgir diante de mim. De repente estourou e, em meio a uma substância branca e pegajosa, surgiu uma linda mulher. Alta e magra, linda e sedutora. Seios fartos, com aréolas bem desenhadas, cabelos negros longos escorridos, que atingiam a metade de suas costas, acinturada com quadris largos e pernas esguias e bem torneadas. Uma fêmea fatal. Um púbis angelical, triangular. Seus olhos negros provocantes e lábios carnudos insinuantes exibiam uma exagerada avidez. Sem saber o porquê, percebi que ela não tirava seus olhos de mim. Não demorou muito e começou a vir a passos trôpegos em minha direção. Não vira mais as quatro pequeninas. Talvez elas também temessem a criatura diante de mim. Mas, quando aquela estonteante mulher, surgida da larva gigante, ficou a alguns palmos de mim, percebi que a queria e ela a mim. Sua beleza era magnífica e me causava um desejo incontrolável. Instantaneamente, minha vagina e minha boca se encheram de líquido para poder receber o que estava por vir. Mal sabia eu que estava diante de uma predadora voraz e faminta, travestida por aquelas suaves e encantadoras formas. Como que me hipnotizando, colou seu corpo ao meu. Uma onda de calor tomou conta de meu corpo. Esqueci do frio, da água e do medo. Estava entregue àquela coisa. Ela segurou minha cabeça molhada entre as mãos e me beijou com apetite, quase enlouquecida. Sugava minha língua, querendo engoli-la. Na verdade eu queria ser devorada por ela. Queria ser possuída. Mas o prazer durou pouco. Minha predadora tinha pressa. A dor não durou mais que alguns segundos. Senti, simultaneamente, ela sugar toda a minha vitalidade. Pela boca sua língua me penetrava e absorvia tudo o que havia pela frente, digerindo-me. Pela vagina, senti uma estranha saliência me penetrando até às entranhas. Pelo ânus, outra me sugava da mesma forma. Dos seus dois enormes e lindos seios, onde deveria haver dois deliciosos mamilos, surgiram duas enormes bocas, que, com dentes afiadíssimos, tomaram os meus. Senti a escuridão e uma dor insuportável tomar conta de mim. Percebi que morria. Mas foram só por alguns momentos, pois logo eu me via através dos vidrados olhos daquela bela criatura. E ela e eu passamos a ser um só ser. Vi meu corpo dilacerado cair inerte no gélido chão de metal da sala.  Assim, uma após outra, todas as mulheres nuas da sala foram possuídas e mortas. Talvez uma boa e oportuna morte. Cada ato tinha sua singularidade. Nenhum êxtase era igual a outro. Os prazeres eram orgasmáticos, tanto para as presas como para mim, agora predadora. Talvez pela individualidade de cada mulher possuída, seus fluidos, seus gostos, seus cheiros. De repente, após absorvido o último suspiro daquelas mulheres, ouviu-se um som estridente. A luz branca tornou-se vermelha e perdi os sentidos... Despertei, não sei quanto tempo depois, sobre a cama de meu quarto. O cheiro de almíscar permanecia pelo ambiente e ainda se ouvia greensleeves. Estava toda ensangüentada, mas viva. Em que mundo? Não sabia. A primeira coisa em que pensei foi tomar um banho. Dirigi-me ao banheiro. Ao cruzar pelo espelho do quarto, vi diante de mim a criatura do meus sonhos. Bela! Incomensurável!  Como sempre desejei ser. A sedução em pessoa. Estranhamente, percebi que podia transformar, com um simples pensamento, meus mamilos em duas lindas bocas de lábios carnudos. Após o banho, senti fortes dores na altura do estômago. Estava faminta novamente. Não de comida, mas faminta de energia, calor, sexo, vida... Desde então, minhas noites nunca foram tão efêmeras... e a feminilidade de cada mulher desperta em mim desejos de um sexo fugaz, porém intenso, lúgubre, letal, gótico. Sexo gótico... Gothic sex...

"Leia livros também! Eles nos fazem ver o mundo com outros olhos!" Copyright © 2005 by B.R.E. Buschtabieren Reading Entertainment Co. All Rights Reserved. Todos os direitos reservados. Reprodução proibida sem prévia autorização por escrito do autor pelo e-mail: suelenbuschtabieren@yahoo.com.br

domingo, 20 de novembro de 2011

Como funciona a Justiça no Brasil.

É preciso acordar e ver que o processo judicial serve como um meio muito pródigo para aquele que não tem razão. Ir a juízo é um martírio para quem tem um bom direito e depende do Judiciário para adaptar um débito bancário, por exemplo, a patamares conformes com a lei.

Márcio Mello Casado*
A vida de um processo

Qualquer ação de cunho contencioso, a tal “briga na justiça”, se não houver alguma espécie de acordo no meio do caminho, deverá ter uma duração média de uma década, considerando-se a data da propositura da demanda e a entrega do bem objeto do litígio ao vencedor. Nesse período, o processo passará algumas vezes pelos tribunais estaduais. Outras tantas pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal.

A justiça funciona mais ou menos assim: (a) o primeiro passo é a petição inicial, na qual o autor da demanda expõe o seu direito; (b) a contestação vem em seguida, momento no qual o réu procura refutar aquilo que o autor alegou; (c) depois, poderá haver uma audiência na qual um acordo pode ocorrer; (d) não havendo a tal composição, o processo segue, com exames periciais, prova testemunhal, etc; (e) o derradeiro passo é a sentença, a qual é proferida por um juiz de primeira instância (aquele juiz que fica no Fórum); (f) após a sentença poderá haver recursos de apelação ao Tribunal Estadual, onde Desembargadores irão examinar a causa de novo; (g) e os últimos passos são os julgamentos dos recursos nos Tribunais Superiores (Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal).


Parece simples, não? Pois é, parece. Todavia, entre a letras “a” e “g” podem ocorrer uma gigantesca quantidade de incidentes. Se a petição inicial contiver um pedido de liminar, havendo ou não deferimento do pedido, poderá haver um recurso ao tribunal estadual. E esse recurso chegará ao tribunais superiores (STF e STJ), enquanto em primeira instância o processo poderá ficar suspenso ou seguir o seu caminho. Se uma prova for deferida, ou indeferida, novo recurso será cabível, e ele chegará também aos tribunais superiores. A verdade é que cada decisão que o juiz tomar no curso do processo pode (e quase sempre será) objeto de algum tipo de recurso.


É difícil avaliar se a existência de tantos momentos para recorrer é ruim. Sob a ótica de quem recorre, evidente, o juiz de primeira instância está errado. Mas isso não faz diferença alguma, porque, certo ou errado, o recurso será interposto e o processo demorará a ter uma solução final.


Mas o que é uma solução final? Ela ocorre quando não houver mais possibilidade de se recorrer da decisão de mérito (aquela decisão que disse que fulano tem razão e que beltrano deve lhe entregar alguma coisa, para ficar em um exemplo bem trivial). Esse evento chama-se trânsito em julgado.


E aí o processo se encerra? Não. Quando houver a decisão final a parte que venceu poderá executar a sentença, pois o cumprimento do julgado não é automático. Se a decisão disser que há um crédito contra o réu, o autor deve intimá-lo a pagar o tal débito. E o réu pode pagar ou simplesmente nada fazer. Em regra, nada faz. E o processo que antes recebia o nome de “ordinário” (nada mais apropriado) passa à chamada fase executiva.


E tudo começa de novo! Inclusive com novas defesas, novos recursos e nova visita do processo aos tribunais estaduais e superiores.


A essa altura é de se perguntar, um processo não termina jamais? A doutrina informa que o processo tem fim sim. A prática forense revela que ele pode não acabar jamais.

(Não vou tratar da ação rescisória que pode haver após o trânsito em julgado da decisão. Mas não custa explicar que, depois de tudo resolvido, tudo pode ser modificado por meio dessa ação própria, embora ela tenha requisitos especiais para propositura que dificultam a revisão da coisa julgada.)


Qual o processo que nunca se encerra? Após vinte anos de prática forense e alguns títulos acadêmicos que pouco significam dentro da batalha contenciosa descobri que se há dinheiro ao lado de quem não tem razão, o céu (ou o inferno, na ótica de infeliz adversário) não é o limite.


As Instituições Financeiras


O pior adversário que se pode ter em um lítigio é uma instituição financeira. Não porque tenham muito dinheiro (isso ajuda, lógico), mas porque elas agem sempre de má-fé, sem exceção. Repito: sem exceção.

Um banco, ao cobrar seus clientes na justiça, ou exige mais do que é devido ou se utiliza dos meios mais virulentos de cobrança que podem existir. Se a instituição tiver a opção de executar um contrato, pedirá a falência. Se puder penhorar um imóvel, pedirá a penhora on-line do dinheiro do devedor. Para quem não sabe, penhora on-line é um procedimento eletrônico no qual o Banco Central do Brasil serve como uma central que distribui as ordens judicias aos bancos, bloqueando os saldos das contas das pessoas, físicas ou jurídicas. Trata-se de um método quase instantâneo de cobrança se você for uma pessoa normal (mais tarde veremos que isso só funciona com você ou com sua empresa, se o devedor for uma instituição financeira, não funciona não).


Mas porque afirmo que bancos estão sempre de má-fé? Não só porque agem da forma acima, mas porque sabem que estão errados e insistem naquilo que é excessivo, pois são poucos os que reclamam. Basta visitar o site do Superior Tribunal de Justiça para ver o que um banco pode cobrar ou não (
www.stj.jus.br). Agora, olhem os seus contratos e vejam que boa parte do que lá está consagrado como ilegal está sendo cobrado de você, nesse momento.

Bancos não têm acesso à internet? Não conhecem as leis? Evidente que sim. Mas que diferença isso faz? Nenhuma. Pode ser que um ou outro cliente reclame, mas a maioria se entrega, não tem força para debater. Engole o ilícito, faz o seguro que o gerente acabou de lher impor e renova o cheque especial.


Aquele que for para a justiça reclamar da ilegalidade irá se incomodar muito. Irá ganhar a demanda se sobreviver ao tempo. Mas terá que passar por restrições cadastrais, visitas de oficiais de justiça, custas processuais, honorários de advogado e mais um sem número de coisas que desanimam qualquer mortal.


O processo demorará anos. Receberá a pecha de mau pagador a cada página das petições da instituição financeira. E, quando tudo terminar, pode ocorrer algo não tão incomum aos sobreviventes: não só o devedor venceu a ação como descobriu que, ao invés de ser devedor, é credor da instituição financeira.


E agora?


O cliente que se descobre credor de uma instituição financeira não tem a vida fácil. Tudo bem, ele tem o título executivo judicial que lhe possibilita penhorar bens do banco. Ótimo, maravilhoso, quero ver cumprir...

O caminho óbvio do cliente credor é pedir ao juiz o cumprimento da sentença (título executivo judicial). Isto é, intimar o banco a pagar o débito. Dinheiro não faltará, imaginará o tolo cliente.


É aí que se descobre que um banco, quando executado, não paga, não indica bens à penhora (e se indica, nunca é dinheiro) e faz de tudo para fugir de suas obrigações. Se o juiz ordena uma penhora on-line contra um banco a diversão é garantida. Um circo é armado. E os palhaços são o cliente e o pobre do juiz que deu a ordem.

Bancos nunca têm dinheiro! A maior parte não tem conta-corrente. Afirmam nos processos, sem qualquer pudor, que o dinheiro que tem é dos clientes. E os poucos recursos que a instituição financeira tem constituem-se em reserva bancária (essa palavra mágica significa que o dinheiro do banco está no Banco Central, em bem apertado resumo).


Tudo que se lê sobre os lucros fantásticos nos jornais ou nos balanços dos bancos desaparece nos processos. São uns coitados. E não se pense que são só os bancos privados que fazem chacota do Poder Judiciário, os estatais ou de economia mista são bem piores. Aí eles usam outro argumento cretino: são instituições de interesse público. Tadinhos. E cumprir uma decisão judicial não é de interesse público?


Se for uma empresa arrendadora a penhora on-line até ocorre. Mas o dinheiro não chega às mãos do juízo, na conta judicial destinada para o processo. É que a arrendadora, do mesmo grupo do Banco onde a conta corrente foi bloqueada, não transfere o dinheiro. Exato, a decisão judicial não é cumprida, deliberadamente. E aí se descobre que a penhora on-line só é on-line para nós, mortais. Um banco tem a faculdade de descumprir a ordem judicial de transferência on-line. E não adianta reclamar para o Banco Central do Brasil.


O juiz até pode ficar indignado, multar o banco, bater o pé, mas a sua ordem só será cumprida quando alguém, de dentro do banco, disser: é... agora não dá mais para segurar.


E o dinheiro, depois de muito tempo, chega à conta judicial.

Grande coisa!


Nesse momento, aquele cliente que já está de cabelos brancos, não só pela idade, mas dos sustos que tomou no curso da demanda, inicia um processo acelerado de calvície.

Ele cai na bobagem de pedir ao juiz que lhe entregue o dinheiro. Afinal, o processo acabou, não há mais defesa alguma do banco pendente de julgamento, senão um recurso meramente protelatório sobre a ilegalidade da penhora on-line.

O que diz a doutrina e a jurisprudência: entreguem esse dinheiro logo!


O que diz o juiz: Não. É necessário que se espere o trânsito em julgado daquele recurso protelatório. O advogado da causa questiona o juiz: Excelência, mas isso não tem o menor fundamento legal. A resposta vem seca: Doutor, o CNJ (Conselho Nacional da Justiça) está de olho, sabe como é?

Não, o advogado não sabe como é. Ele sabe que está naquele processo há quinze anos. Sabe que não há recurso algum pendente, exceção ao que não deveria ser impedimento algum. Sabe que trabalhou sério em favor de seu cliente. Sabe que os magistrados que julgaram a demanda nessa década e meia são pessoas sérias (alguns até já morreram, inclusive, que Deus os tenha).


E, acima de tudo, sabe que está cansado.


Um dia o processo acaba

O tempo passa. Mais um ou dois anos. Já não há mais recurso algum pendente de julgamento. O advogado retorna ao juiz (agora já é outro) e pede, novamente, o levantamento do dinheiro.

O juiz, sempre muito cauteloso, manda que a serventia judicial certifique que não há mais recurso algum pendente de julgamento. E o alvará é entregue ao advogado.


Em direção ao banco depositário judicial ele liga para o filho do cliente e informa que irá sacar o dinheiro. Parabéns, doutor, se meu pai estivesse aqui ficaria muito feliz.

Cadê o seu pai? Doutor, ele foi ao banco prorrogar um contrato. Acho que teremos que entrar com outra ação...
 
(*) Advogado. Mestre e Doutor em Direito – PUC/SP