A Idade Média foi um período histórico em que o cristianismo se tornou a crença predominante em toda Europa Ocidental.1 Em  quase todo continente, a maior parte da vida social, moral e política  das pessoas era determinada pelos ensinamentos e pela ação da Igreja  Católica Romana. 
A disseminação dos  dogmas cristãos era tão intensa que no século IX, não existia na Europa  Ocidental ninguém que não acreditasse em Deus. A Igreja controlava a fé,  normatizava os costumes, a produção cultural, o comportamento e,  sobretudo, a ordem social. Até mesmo o tempo era controlado pela  religião cristã, pois, as pessoas marcavam o ritmo de suas vidas pelo  toque dos sinos das igrejas. Como eram completamente voltados para as  práticas religiosas, acreditavam que a vida na Terra seria apenas um  momento antes da eternidade, que seria vivida ao lado de Deus. 
A influência da Igreja  também se fazia presente nas relações políticas, onde os Papas sagravam  os Reis e legitimavam o poder dos senhores feudais. Como a sociedade era  constituída por pessoas iletradas e desprovidas de conhecimento,  a Igreja mantinha o controle do saber erudito, pois, detendo informações e  conhecimentos importantes, garantia de forma inabalável a extensão de  seu domínio ao longo de vários séculos. 
Aqueles que questionavam  ou discordavam das práticas impostas pelos dogmas religiosos, eram  considerados adversários da Igreja de Deus, chamados de hereges. Contra  os hereges, a religião desencadeou uma guerra sem tréguas. Como forma de  repressão, criou a Excomunhão e o Tribunal do Santo Ofício, conhecido  como Santa Inquisição. A excomunhão era o ato que impedia o cristão  receber os benefícios da salvação, concedidos por seu intermédio. Nesse  caso, era preferível para muitos homens medievais, morrer a ser  excomungado. A Inquisição julgava os hereges dissidentes e os que  recusavam a se retratar eram condenados à morte na fogueira. 
Na Filosofia, os  pensadores medievais, chamados doutores da Igreja, voltaram-se para as  questões relativas aos dogmas e aos preceitos da fé, combinando por  vezes elementos da filosofia greco-romana com ensinamentos cristãos. A  Escolástica foi a filosofia predominante e representava uma tentativa de  conciliar fé e razão à luz do pensamento aristotélico, agregando  elementos da filosofia pagã com a doutrina cristã. 
No campo do conhecimento  científico, grande parte dos historiadores afirma que a Igreja pouco,  ou nada, favoreceu ao seu crescimento. Aqueles que tentaram produzir um  saber científico sem o aval da religião cristã foram reprimidos. Roger  Bacon, monge franciscanos, foi condenado à prisão, Galileu foi reprimido  e Giordano Bruno foi condenado à fogueira. (sendo os dois últimos  pós-medievais) 
[...] O cristianismo  rompeu a união entre o homem e a natureza, entre o espírito e o mundo  carnal, potencialmente distorcendo o relacionamento entre os dois em  direções opostas e atormentadas: o ascetismo e o ativismo. [...]  Ambrósio de Milão expressou a nova opinião oficial ao condenar como  ímpias até as puramente teóricas ciências da astronomia e da geometria.  [...] 2 
Até meados do século  XVII, a fé cristã permeava toda e qualquer parte da organização social,  política e econômica da Europa e dos Países por ela colonizada.3 Porém, novos acontecimentos mudaram o rumo da história. A partir do Renascimento,4  deu-se início ao embate entre Deus (teocentrismo) representado pela  Igreja e o homem (antropocentrismo). O mercantilismo incentivou as  Grandes Navegações, época em que foi percebida a possibilidade de se navegar  diretamente pelos mares, já que a terra tinha a forma esférica e não  plana como se acreditava na Idade Média. O Capitalismo foi tomando lugar  na economia, contrariando a Igreja que condenava o lucro e a usura. A  própria Reforma Protestante5 representou a possibilidade de se questionar os dogmas da Igreja Romana. No século XVIII, o Iluminismo,6  com suas idéias críticas e libertárias, propiciou o avanço da  racionalização na sociedade. A produção cultural se deslocou do domínio  da Igreja (o sagrado) para o das pessoas comuns (o profano, o leigo).  Começava-se a laicização ou dessacralização, era a chamada Idade  Moderna. Deus, tendo a Igreja como seu principal representante na terra,  começava a perder seu espaço e sua autoridade entre os homens, que pouco a  pouco se desprendia da dogmática religiosa. 
A Modernidade é marcada,  principalmente, pela nova concepção do pensar. A rejeição de Deus, dos  dogmas e instituições eclesiásticas; o individualismo; a crítica das  ilusões; o desenvolvimento das técnicas e o fortalecimento do Estado  democrático. A ruptura do indivíduo com o bloco sócio-religioso, aparece  logo no início da modernidade, tendo conseqüências em todos os  segmentos: cultura, economia, direito e política.7 Para os  modernos, a vida moral deverá desprender-se da religião. A Igreja terá  que renunciar ao governo e ao controle da vida política. 
No pensamento moderno,  Descartes rompeu com o aparato escolástico e iniciou o discurso  racional. Kant, com sua visão agnóstica, afastou a fé de qualquer  entendimento racional (Fé e razão atuam distintamente). Strauss  identificou a vida de Cristo com a Teoria do Mito, entendendo o  Evangelho como algo historicamente datado, longe de qualquer caráter  sobrenatural ou divino. Feuerbach assegurou ser Deus uma projeção dos  desejos de perfeição do homem. Para ele, era a alienação do homem que  havia criado a crença no Ser Supremo. Marx afirmou que a religião seria o  ópio do povo. Darwin, com sua "Origem das Espécies",8 abalou a teoria bíblica da criação do homem e da natureza. Por fim,  Freud mostrou que as ações humanas são determinadas pelo inconsciente e  que Deus seria uma projeção da imagem paterna impregnada desde cedo na  mente do homem.
A modernidade destruiu  a "totalidade" da religião, ou seja, separado o que era revelado por  Deus e codificado pela Igreja, daquilo que era percebido pelos homens e  por eles transformado em teorias. A religião autorizou a Ciência, como  também a Arte, a Política e, mais tarde, a Ética a adquirir sua  autonomia e constituir sua própria escala de valores. Uma distinção  encontrada no próprio livro sagrado cristão, (dai a César o que é de  César e a Deus o que é de Deus) 9 divisão direta entre poder  temporal e poder espiritual. A partir daí, uma nova visão vai marcar o  pensamento do homem moderno. Se antes era tarefa da religião oferecer  uma consciência à sociedade, agora cabia às Ciências apresentar  explicações racionais para os fenômenos ocorridos no mundo (dentro e  fora dele).
Essa forma de pensamento  teve seu ponto culminante no século XX, quando não só a Ciência  desagregou, de forma definitiva, qualquer apelo ao sobrenatural, como  também, a maioria das constituições políticas que surgiram, afirmaram  sua posição secular e agnóstica, separando-se das crenças. O próprio  regime socialista soviético chegou a se declarar um Estado Ateu. Desta  forma, mesmo que a religião ainda constitua um poderoso fator de  mobilização das massas e um insubstituível apoio ético e moral, faz-se  necessário o reconhecimento de que as elites modernas deram as costas  para Deus.
Diante desse contexto, e  analisando de forma reflexiva a sua volta, Nietzsche (1844-1900)  declarou, nas palavras do personagem Zaratustra, A morte de Deus: 
"Zaratustra, porém, ao  ficar sozinho falou assim ao seu coração:  Será possível que este santo  ancião ainda não ouviu no seu bosque que Deus já morreu?"10 
A morte de Deus é a  constatação do niilismo na modernidade,  é a percepção cada vez maior da  ausência de Deus no pensamento e nas práticas do Ocidente  moderno. Para ele, o homem moderno perdeu a confiança em Deus e  suprimiu a crença no "mundo verdadeiro", o mundo perfeito que vem após a  morte do corpo material, originário da metafísica e do cristianismo. A  substituição da Teologia pela Ciência e o ponto de vista de Deus pelo  ponto de vista do homem, provocou a ruptura com os valores absolutos,  com a essência e com o fundamento divino. 
Na verdade, a morte de Deus já  se fazia presente na consciência do europeu desde o século XIX, o que  ainda não haviam percebido era que esse fato implicava  na desvalorização  dos valores morais, ou seja, o fim do Deus cristão também foi o fim da  moral por ele estabelecido, através do cristianismo. O culto do  progresso, a proclamação da igualdade e o crescimento do conhecimento  científico, transformaram a humanidade numa massa de indivíduos  indefinidos ainda mais escravizados, sem força e sem autenticidade. Ao  perder a legitimidade provinda de suas origens tradicionais e as suas  garantias exteriores, representada pelos deuses, heróis e as monarquias  de instituição divina, a sociedade moderna é condenada a tomar a si  mesma como fundamento, pois não existe mais proteção divina (ela é  auto-suficiente, atéia). Terá agora que reinventar seus próprios  valores.
A modernidade apreende  então uma crítica aos seus próprios valores. As grandes Guerras, os  Estados totalitários socialistas, nazistas e fascistas fizeram, por si  só, as críticas práticas. A crítica agora não é feita apenas aos antigos  valores, às hierarquias do antigo regime, à moral religiosa nem às  autoridades hereditárias. A crítica visa agora os próprios valores  modernos, a liberdade, a igualdade e a razão.
O século XX foi a época  em que a razão se propôs a guiar a humanidade. O triunfo das ciências  iluminou as zonas de incertezas e ilusão que atormentava os homens. A  modernidade se apresentou como um começo absoluto de uma nova era, a  instituição de um novo mundo e de novos valores edificados sobre o reino  da Razão. Até que o totalitarismo desenfreado e as duas Guerras  Mundiais puseram em contradição a sociedade moderna. Em 1914, a primeira  Grande Guerra deu início à barbárie. As forças criadas para a  organização e para a técnica contrapuseram-se às forcas da razão e da  ciência que outrora lhes haviam produzido. 
A partir deste momento, a  Europa (e o Ocidente) entra em estado de convulsão. Em plena guerra, a  Revolução Bolchevique assume o poder na Rússia, onde mais tarde se  transformara numa ditadura socialista, influenciando também outros  países. Em 1933, o nazismo chega à Alemanha e, a partir daí, grande  parte da Europa vai permanecer sob o domínio de ditaduras  nazi-fascistas. Em 1936, começa a Guerra Civil espanhola que antecede a  Segunda Guerra Mundial, tendo como conseqüência o holocausto de judeus.  Na atualidade, o terrorismo globalizado, seguido da violência brutal  contra os direitos humanos, evidencia um novo surto de barbárie.
O homem moderno agora  faz pergunta tipo: Como ser um santo sem Deus? Ou como substituir Deus?  Os primeiros modernistas responderam que seria através da moral da  humanidade, baseada na razão. Mas esta razão é fria, seca e  individualista. Na medida em que os valores se contradizem, os fatos e a  realidade demonstram inconsistência. Como fugir da barbárie? A segunda  fase da modernidade, iniciada com a primeira Grande Guerra, faz a  humanidade tomar consciência de que é frágil e que sua salvação  encontra-se na sua própria capacidade de recriar, sem cessar, seus  valores e suas instituições. Deverá o homem moderno agora, relançar  permanentemente a democracia. A pergunta talvez seja a seguinte: Recriar  valores e relançar democracia, baseado em quê? Na fé ou na ciência? O  homem moderno parece perdido, solitário e desprotegido.
  
[...] parece, pelo  menos a esses, que um sol acaba de se pôr, que uma antiga e profunda  confiança se tornou dúvida: o nosso mundo parece-lhes fatalmente todos  os dias mais vesperal, mais desconfiado, mais estranho, mais  ultrapassado. [...] 11 
Nietzsche percebeu a  humanidade em sua elevada pretensão de aumentar seu conhecimento e seu  poder, sem perguntar sobre os fins (mais tarde, a bomba atômica foi o  exemplo). O moderno, acreditando que tudo seria explicado, descobre que  há uma falha na explicação. Agora, tudo se afunda, nada mais tem  sentido. Percebe-se que nada é visado, não existe objeto futuro,  instalou-se o niilismo. O homem será agora uma consciência  infeliz, sabe que o mundo, tal como imaginara, não existe, e o que  existe de fato, não deveria existir.
A proposta nietzscheana é a transmutação dos valores, no qual surge o (Übermensch) super-homem, aquele que através da vontade de poder, rompendo com os valores cristãos, superará o niilismo e criará novos ideais.   
Eu vos apresento o  super-homem! O Super-homem é o sentido da terra. Diga a vossa vontade:  seja o Super-homem, o sentido da terra. 12 
Para Nietzsche, o  niilismo tem início ainda na antiguidade a partir da teoria  socrático-platônica que inventa um mundo ideal, onde a verdade pode ser  encontrada, e condena o mundo real, dito das aparências e ilusões. Esta  teoria é mantida pelo cristianismo. Porém, se esse mundo em que vivemos  não existe, toda filosofia desenvolvida em nome dele é um erro, o que  remete ao niilismo do homem moderno. Após a morte de Deus, a  interpretação moral da vida e do mundo se esfacelou, abrindo caminho  para a propagação do niilismo.
A morte de Deus marca o  fim da dualidade entre o sensível e o supra-sensível, o mundo que sobrou  parece falso e desprovido de valor. Ao eliminar o mundo ideal,  formulado pelo cristianismo, a morte de Deus elimina também o mundo real  em que estamos. Como conseqüência, se o mundo verdadeiro não existe,  tudo em que se acreditou até aqui, era mentira. A morte de Deus criou um  vazio na modernidade. Este vazio pode ser preenchido, segundo  Nietzsche, pelo super-homem, produto da manifestação de novos valores. 
Noutros tempos,  blasfemar contra Deus era a maior das blasfêmias; mas Deus morreu, e com  ele morreram tais blasfêmias. Agora, o mais espantoso é blasfemar da  terra, e ter em maior conta as entranhas do impenetrável do que o  sentido da terra. 13 
Diante dos fatos, o  homem moderno se encontra cansado da vida, sua vontade deseja o nada,  pois há muito já está esgotada. A morte de Deus representa a falta de  perspectiva para criar novos valores e superar o estado niilista em que  se encontra. Até este acontecimento, toda moral era divina, aceitava-se e  obedecia-se sem questionar, mas, e agora? A desvalorização desses  valores trouxe o niilismo, a falta de sentido. Porém o niilismo  possibilita também, como dizia Nietzsche, a possibilidade de criar novos  valores, uma mudança na mentalidade, que só a partir daí seria  possível. A questão é: qual a base para fundamentar esses novos valores,  a fé representada pela religião, ou a razão representada pelas  ciências? Na contemporaneidade, o homem tem bastante o que refletir. Só  através da reflexão analítica a razão poderá prevalecer sobre o  niilismo.
(*)  Graduando em História e Filosofia
1. Exceto na península ibérica, ocupada pelos árabes de religião muçulmana.
2. ANDERSON, Perry. Passagem da Antiguidade ao Feudalismo, Brasiliense. p.128
3. Os países colonizados seguiam a religião oficial das Metrópoles.
4. Movimento cultural que teve início na península itálica ainda no século XIV.
5. Movimento de transformação religiosa representado inicialmente por Martinho Lutero.
6. Movimento cultural que se desenvolveu na Inglaterra, Holanda e França, nos séculos XVII e XVIII.
7. Sendo fato de objeção entre alguns pensadores contemporâneos, a total laicização do Estado.
8. Livro em que Darwin propõe a teoria de que os organismos vivos evoluem gradualmente através da selecção natural. 9. Bíblia Sagrada - Mateus 22:21
10. NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra, tradução Pietro Nassetti. São Paulo. Martin Claret, 2002. p.25
11. ____________________. A Gaia Ciência, tradução Jean Melville. São Paulo. Martin Claret, 2007. p. 181
12. NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra, tradução Pietro Nassetti. São Paulo. Martin Claret, 2002. p.25
13. Ibidem. p. 25
Referencias:
ALMEIDA, Giuliano Cézar Mattos de. Revista Ética & Filosofia Política, Volume 8, Número 1, junho/2005.
CARVALHO, José Jackson Carneiro de. A modernidade e os caminhos da razão: ensaio de Filosofia social e política, 2ª. ed. Atual, amp. – João Pessoa: Editora Universitária / UFPB, 2006.
NIETZSCHE, Friedrich. Breviário de citações ou para conhecer Nietzsche, seleção, tradução e notas de Duda Machado. 2ª ed. São Paulo, Landy, 2001.
___________, Friedrich. A Gaia Ciência, tradução Jean Melville. São Paulo. Martin Claret, 2007. 
___________, Friedrich. Assim falou Zaratustra, tradução Pietro Nassetti. São Paulo. Martin Claret, 2002.
Fonte: texto enviado por e-mail pelo Cepec- Centro de Estudos Politicos Econômicos e Culturais. (Revisei ortográfico e gramaticalmente - Ramiro R. Batista)